Chegou o momento de Joana Pinhão mostrar a sua interpretação do que pode ser um vinho elegante e fresco da região vitivinícola do Tejo. Como se fechasse um círculo, regressa às origens, após doze anos de sucesso no Douro. A Joana é do Ribatejo, de Alpiarça. Aqui, a tradição vitivinícola está bem enraizada e tem uma longa memória.
Joana cedo acompanharia os avós e os pais nas vinhas e nos olivais, como muitos jovens, no meio rural, as férias escolares, no verão, eram de menos descanso ou lazer. Entre as actividades da estação estiveram as vindimas suadas, que marcaram, o que se fez sentir quando chegou o momento de se decidir pelo caminho profissional, indo cursar engenharia agronómica no Instituto Superior de Agronomia de Lisboa em 2000, sempre com o objectivo de aprender e dedicando-se ao mundo do vinho e da vinha.
Teve ainda tempo para estagiar no bairro, na Casa Cadaval em 2006, e no ano seguinte, em 2007, integrou a equipa de enologia da Quinta Vale Dona Maria, onde permaneceu até abril de 2019.
Foi o Douro, então fervilhante de energia, de personalidades inquietas e onde se desenrolaram múltiplas evoluções, que a fez crescer e lhe deu experiência e, onde ainda hoje mantém laços profissionais.
Em 2009 e 2010 aproveitou para vindimar na região do Toro, em Espanha, e em 2012 foi à África do Sul conhecer a realidade vitivinícola do Hemisfério Sul.
No entanto, ficou um sonho por realizar, a criação de um projeto pessoal na região que a acolheu, o Douro. Em 2011, em parceria com o enólogo Rui Lopes, amigo e colega dos tempos em que estudava no Instituto Superior de Agronomia, o sonho de fazer o seu próprio vinho mostrando a sua visão sobre o Douro e as suas vinhas velhas, concretizou-se com a criação da marca Somnium.
Com o tempo, e vendo o reconhecimento que a região do Tejo tem vindo a adquirir, surgiu a ideia de avançar com outro projeto pessoal, agora na região que a viu crescer, Alpiarça.
Aproveitando as vinhas do bisavô, 4 hectares adquiridos em 1916, entretanto arrendados e posteriormente recuperados, Joana deu à luz o seu projeto a solo e pessoal, o Casal das Aires. Nome herdado junto com a propriedade.
Em 2015 reconverte as vinhas da Charneca (uma das três zonas da região vitivinícola do Tejo), onde aposta em várias castas nacionais como a Touriga Nacional, Tinta Roriz, Touriga Franca, Bastardo, Bical, Arinto, Fernão Pires, Alvarinho , Loureiro, Avesso e nas internacionais, Chardonnay, Pinot Noir, Syrah e Alicante Bouschet. Um total de 16 variedades plantadas em 3 dos 4 hectares, para ter disponível uma variedade de variedades para que possa “brincar”, experimentar, acrescentando à equação a complexidade dos quatro tipos de solo que tem à sua disposição.
Também não deixa de fora as castas tradicionais da região como as Trincadeiras, Preta e das Pratas, cuja raridade tinha desafiado o interesse de Joana em experimentá-las.
Aqui, Joana não se dedica apenas à enologia, faz também a parte da viticultura em que privilegia a baixa produção em detrimento da quantidade. Tem também sempre como objetivo a sustentabilidade do ecossistema vitícola da região, a par da promoção da biodiversidade nas vinhas.
As castas Chardonnay e Pinot Noir merecem especial atenção, simplesmente porque Joana gosta muito delas e porque, com base nelas, ficam na sua memória alguns dos grandes vinhos da região francesa da Borgonha, alguns dos quais se tornaram os seus preferidos. Ela está tentando descobrir como essas variedades funcionam em Heath. São também as variedades preferidas das aves que obrigam Joana a proteger o seu tesouro com redes.
Além da propriedade replantada, arrendou duas vinhas velhas, cada uma com meio hectare. Uma delas com Fernão Pires plantada na década de 1930 com clones velhos em solos arenosos da Charneca e outra vinha com Alicante Bouschet com cerca de 60 anos.
Como o projeto é recente, as coisas na adega decorrem na Quinta da Lagoalva de Cima, onde o amigo Diogo Campilho reservou um cantinho para ela dar vida ao seu projeto, enquanto não tem adega própria.
Os primeiros vinhos Casal das Aires, da colheita de 2018, foram lançados em 2019, onde já denunciavam a frescura e elegância que caracterizam os vinhos.
Os vinhos da colheita de 2019, Chardonnay e Pinot Noir, confirmariam os sinais iniciais, agora com maior precisão no caminho da elegância e sofisticação. Também se estreou a gama Vinhas Velhas, com grande qualidade. Um Fernão Pires rico, perfumado e texturizado, e um opulento Alicante Bouschet, senhor de intensa frescura e forte carácter.
Querem destacar-se numa nova abordagem aos vinhos do Tejo, interpretando o seu terroir e as castas de forma inovadora, mas sem perder a relação com o passado. Eles parecem estar indo na direção certa. Um Tejo a descobrir!